Desdobramento mais impactante da operação se deu nas denúncias de corrupção envolvendo
ex-diretores da Petrobras e dois deputados federais
Publicado em 30/12/2014, às 11h19
Da Agência Brasil
Sem ter o pedido de cassação de mandato julgado pela Câmara, o deputado Luiz Argôlo pode ter o processo arquivado e os
direitos políticos mantidos mesmo com denúncia de que era sócio de Alberto Youssef
Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
A Operação Lava Jato, da Polícia Federal, provocou fortes impactos políticos no país e pode ainda atingir novos agentes públicos em 2015. Até o momento, o desdobramento mais impactante da operação se deu nas denúncias de corrupção envolvendo ex-diretores da Petrobras e dois deputados federais. Os desdobramentos resultaram na instalação de duas comissões parlamentares de inquérito, pelo Congresso Nacional, e na prisão de diversos executivos das maiores empresas de engenharia do país, acusados de corrupção, fraude a licitações e crimes financeiros, pelo Ministério Público Federal (MPF).
A primeira etapa da Lava Jato ocorreu em março, quando a PF executou 24 mandados de prisão, 15 conduções coercitivas e 81 buscas e apreensões para desmontar quatro quadrilhas diferentes que eventualmente se relacionavam para lavar dinheiro de crimes diversos como tráfico de drogas e de diamantes, corrupção de agentes públicos e câmbio paralelo. Em comum, os quatro grupos usavam doleiros e empresas off shore para mandar o dinheiro ilegal para o exterior, bem como lavanderias e postos de combustíveis para legalizar os recursos que ficavam no país ou retornavam do exterior. Cerca de US$ 10 bilhões foram movimentados pelos criminosos, em três anos.
Em um segundo momento, depois de examinar documentos e contratos de empresas de fachadas apreendidos na operação, os investigadores chegaram a diversos contratos fraudulentos firmados com a administração pública e à corrupção de agentes públicos, entre eles, dos diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque. No Congresso, em abril, a oposição apresentou requerimento de criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) no Senado e outra idêntica, porém com a participação de deputados (CPMI), para investigar as denúncias na maior empresa do país.
No escopo da investigação parlamentar, os oposicionistas propuseram, também, que fossem analisados os indícios de irregularidades na compra da Refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, e na construção da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, também chamada Rnest.
À época, a base do governo usou o argumento de que a oposição usava o assunto como campanha eleitoral. Os governistas propuseram também a criação de duas comissões parlamentares de inquérito, uma no Senado e outra mista, para investigar os mesmos fatos acrescidos de outros contratos públicos sob suspeita de corrupção em estados e municípios governados por membros da oposição.
A chamada guerra de CPIs foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu que todos os requerimentos tinham validade, mas os que tivessem sido apresentados primeiro teriam prioridade. Assim, foram instaladas, em maio, a CPI da Petrobras no Senado e a CPMI da Petrobras no Congresso. A primeira foi abandonada pelos oposicionistas, que preferiram focar as atividades na comissão mais ampla, com a participação dos deputados. A primeira a depor foi a presidenta da empresa, Graça Foster, que se disse “envergonhada” pelos indícios de que diretores estavam envolvidos em casos de corrupção.
Em julho, o Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou relatório que pediu a condenação de 11 diretores da petroleira e a devolução de US$ 792 milhões pelos prejuízos provocados na compra da refinaria americana. Apesar disso, a oposição criticou a decisão por não condenar a presidenta Dilma Rousseff, que na época da compra de Pasadena presidia o Conselho de Administração da Petrobras, responsável pela decisão.
Em setembro, ainda no âmbito da CPMI da Petrobras, os parlamentares tentaram ouvir o ex-diretor preso Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, considerados peças centrais nas investigadores da Lava Jato. Na comissão, ambos permaneceram calados sob a justificativa de que tinham feito acordos de delação premiada com a Justiça e suas informações deveriam permanecer em sigilo.
Em outubro, no entanto, Costa e Youssef prestaram depoimentos à Justiça, fora do processo de delação premiada. Neles, os dois relataram que o dinheiro da Petrobras foi desviado durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio da Silva e de Dilma e abasteceram os caixas de partidos políticos. Segundo os delatores, os partidos indicavam diretores para a petroleira que negociavam propinas com as empreiteiras em troca de contratos. A propina variava entre 1% e 3% dos valores dos contratos.
As novas denúncias não foram suficientes para movimentar a CPMI no mês das eleições e os requerimentos de convocação dos tesoureiros de partidos e agentes políticos citados como beneficiados pela corrupção não foram aprovados. Em dezembro, Paulo Roberto Costa foi novamente levado à CPMI para uma acareação com o também ex-diretor Nestor Cerveró, acusado de ter produzido o relatório que favoreceu a compra de Pasadena. Durante o embate, Costa declarou que o caso da Petrobras se repete em todos os outros setores públicos do Brasil - “nos portos, nos aeroportos, nas rodovias, nas ferrovias e nas hidrelétricas” - e disse que “ninguém chega à diretoria da Petrobras sem uma indicação política”.
Por fim, o relatório final da CPMI foi aprovado com o pedido de indiciamento de 52 pessoas, algumas já presas e processadas pelos crimes da Operação Lava Jato. O relator, deputado Marco Maia (PT-RS), pediu o aprofundamento de investigações nas empresas citadas e considerou que o prejuízo com a compra de Pasadena chegou a US$ 561,5 milhões – menor que os US$ 792 milhões apontados pelo TCU. Nenhum fato novo foi apontado pelo relatório em relação ao apurado pela Polícia Federal e o Ministério Público.
A CPMI da Petrobras não foi o único desdobramento da Lava Jato no Congresso. Devido ao vazamento de áudios e informações do inquérito da Polícia Federal, no início das apurações, foram identificadas as relações dos deputados André Vargas, então vice-presidente da Câmara e eleito pelo PT do Paraná, e Luiz Argôlo (SD-BA) com o doleiro Alberto Youssef.
Vargas admitiu ser amigo de Youssef há 20 anos e ter usado um jatinho do doleiro para viajar de férias com a família para João Pessoa, embora tenha garantido que pagou pelo combustível. No entanto, o deputado também foi acusado de intermediação de contratos de interesse do doleiro com o Ministério da Saúde e acabou cassado pelo plenário da Câmara dos Deputados por quebra de decoro parlamentar. Antes disso, ele renunciou à vice-presidência da Câmara e saiu do PT, que tentou pedir seu mandato na Justiça, mas ainda não teve o caso julgado. Com a cassação, o ex-deputado se tornou inelegível pelos próximos oito anos, de acordo com a Lei da Ficha Limpa.
Mensagens de telefone e gravações entre Argôlo e Youssef também levaram à abertura de processo contra o deputado no Conselho de Ética da Câmara. Em depoimento aos membros do conselho, a contadora do doleiro, Meire Poza, disse que Argôlo era sócio de Youssef e recebia dinheiro dele com frequência. Em uma das conversas deles vazadas à imprensa, o deputado consulta o doleiro sobre a possibilidade de assumir uma vice-liderança na Câmara ou a presidência de uma comissão. Apesar das denúncias e de ter tido a cassação aprovada pelo conselho, o ano terminou sem que a perda de mandato de Argôlo fosse votada no plenário. Como não se reelegeu deputado, ele pode ter o processo arquivado e os direitos políticos mantidos.