Por Renato Lima
Deve ter sido muito difícil para José de Souza Alencar, o Alex, continuar trabalhando por tantos anos como colunista social. Cheguei a conviver com ele na redação do JC por alguns bons anos. Alex ainda estava lá, mas a sociedade que ele retratava havia mudado, o jornalismo também, bem como os colegas de redação. Ele, que chegou a ser um dos mais poderosos jornalistas do estado, era uma sombra de um passado. Era uma peça antiga numa engrenagem diferente.
Disso poderia resultar uma pessoa de difícil convívio. Mas não era o caso. Alex era bastante afável, de sorriso fácil e adorava conversar. Para preparar a sua coluna de um quarto de página, chegava cedo na redação, trabalhava com um assistente que digitava as suas notas e crônicas e pouco antes do meio dia já voltava para casa. Por vezes conversávamos durante esses breves períodos pela manhã. Quando lançou um livro, de pronto aceitou ir até o Café Colombo na Universitária FM para conversar com a nossaEQUIPE – o que resultou numa excelente entrevista, que fez parte do nosso livro Conversas no Café I. Subiu com dificuldade, mas determinação, cada degrau das escadas da Universitária até o estúdio. Prédio grande e antigo, feito antes das exigências de mobilidade tão necessárias hoje em dia. Alex dava um passo e parava. Tomava ar. Falava alguma coisa. Outro passo e parava. Dificuldade e determinação talvez sejam duas palavras boas para classificar Alex.
>> Escute a entrevista de Alex ao Café Colombo
Dificuldade porque a sociedade que Alex retratava já não estava mais lá. Coluna social é essencialmente elitista e mesmo em Pernambuco houve uma alteração das elites no momento em que as principais atividades econômicas também se transformaram. Fora isso, há a mudança de geração. A colunável de um dia comemora ser mãe de debutante e, depois, mãe da noiva. Mas fotos de avó e bisavó já não são notícias de coluna social – ainda que as mesmas fontes continuem amigas.
Determinação porque mesmo com as mudanças de sociedade e de colegas de trabalho, Alex escrevia suas crônicas. Crônicas que soavam anacrônicas, destoando do jornalismo rápido e contemporâneo que circundavam a sua coluna. Paradoxalmente, as crônicas de Alex, reflexo de uma era, pareciam produto de um nova forma de expressão: a escrita para blog. Reflexões por vezes despretensiosas, livres, que abundam na web pelo custo zero de sua publicação. Mas que num espaço de jornal – onde espaço impresso é dinheiro – chamavam a atenção.
Em entrevista a este Café Colombo ele disse que queria morrer “no palco”, trabalhando. Quase conseguiu isso – morreu aos 88 anos, tendo trabalhado no JC de 1958 a 1997 na principal coluna social e, depois, com uma coluna menor. Quando saiu do JC, ainda foi acolhido pela Folha de Pernambuco, onde escrevia crônicas semanais, continuando até o limite de sua saúde.
Todos somos, até certo ponto, produtos de nossa época. Alguns sobrevivem a sua própria época e representam pontes com o passado. Alex foi um dos melhores produtos de sua época, aquela em que jornais eram centrais na vida social das cidades. Era uma pessoa de idade fazendo um jornalismo que também havia envelhecido, mas conheceu o apogeu desse jornalismo e foi o seu melhor representante. A fórmula de colunismo social, essencialmente envelhecida, é hoje praticada por gente nova, que retrata a circulação de elites que houve e usa uma nova linguagem. Mas, no fundo, é um tipo de jornalismo datado e que já teve o seu ápice. E a cada dia soa mais provinciano.
A morte de Alex foi registrada em comunicados oficiais do governador Paulo Câmara e do prefeito Geraldo Júlio. Dois casos de novas elites que não conviveram com a sociedade retratada por Alex e que devem usar mais redes sociais do que colunas sociais.
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