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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Paralisação dos policiais do ES pode se generalizar e resultar em intervenção militar, diz especialista


mediaProtesto de moradores em frente ao quartel-geral de VitóriaTânia Rêgo/Agência Brasil
O movimento das famílias dos policiais militares, que suspende o policiamento desde a última sexta-feira (3) no Espírito Santo, gerou caos na maioria das cidades do Estado e deixou 95 mortos até esta quinta-feira (9). Especialistas entrevistados pela RFI temem que a situação se degrade ainda mais, caso um acordo não seja encontrado entre o governo e os PMs, resultando em um conflito civil ou até mesmo em uma intervenção militar.
“Se esse movimento se generalizar por todo o país, provavelmente poderemos assistir a uma espécie de golpe militar, no qual o exército ocupará as ruas de todas as capitais brasileiras”, prevê o coordenador do Mestrado em Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Cláudio Luiz Zanotelli, que pesquisa a violência e políticas de segurança. Ele lembra que a instabilidade política Brasil, após a destituição da presidente Dilma Rousseff, contribui para esta possibilidade.
Pablo Lira, professor do mestrado profissional de Segurança Pública da Universidade de Vila Velha e coordenador do Núcleo de Vitória (ES) do Observatório das Metrópoles, compartilha a ideia sobre a generalização do movimento dos PMs, que exigem um reajuste dos salários, inexistente há três anos. Ele salienta que PMs de outros Estados começam a se organizar para realizar o mesmo tipo de mobilização. Uma prova disso é que, para evitar o mesmo movimento, o governo do Rio de Janeiro anunciou na quarta-feira (8) um aumento de até 10,22% de policiais militares e civis, bombeiros, agentes penitenciários e funcionários das secretarias de Segurança e Administração Penitenciária.
Risco de incidentes de violência entre civis é iminente
Outra possível consequência da situação que vive o Espírito Santo é um conflito entre a população. Segundo Lira, uma parte da população está extremamente revoltada com o movimento dos PMs. “O clima de tensão é extremo e o risco de acontecer incidentes de violência entre, por exemplo, civis e as famílias dos policiais militares - que bloqueiam a saída de viaturas das delegacias - é iminente”, diz.
Já para Zanotelli a mobilização que suspende o policiamento no Espírito Santo trouxe à tona um ódio social sem precedentes no país. Ele ressalta que nas redes sociais, civis reivindicam “o direito de matar aqueles que chamam de bandidos”. No entanto, lembra que, na ausência dos policiais militares, a própria população vem saqueando lojas e supermercados.
“Tudo isso acontece devido a um governo incompetente, incapaz, que cruza os braços e propõe como alternativa convocar o Exército para proteger a população”, avalia. Enquanto isso, enfatiza Zanotelli, as pessoas se trancam dentro de suas casas e serviços públicos, escolas, comércios e transportes deixaram de funcionar.
Lira também ressalta o desdém do governo federal em relação ao problema. “Neste momento em que vivemos uma crise do sistema prisional nos Estados do Norte e do Nordeste, e a crise da segurança pública no Espírito Santo, a principal preocupação da classe política é de qual partido será o novo ministro da Justiça e Segurança da Segurança Pública. A única prioridade deles neste momento é amenizar as ações da operação Lava Jato”, reitera.
De acordo com o especialista, a falta de urgência com que são tratadas essas questões contribui para a banalização da criminalidade e da violência no Brasil. “Durante esses últimos dias sem policiamento, vemos pessoas sem histórico criminal arrombando lojas e supermercados, roubando eletrodomésticos e celulares. Na televisão, assisti a uma cena lamentável, de uma família roubando produtos de higiene e fraldas em uma farmácia, diante de seus filhos pequenos”, conta. Para o especialista, isso mostra que além das políticas de segurança pública, o Brasil enfrenta também falhas em suas políticas de base, como educação, saúde, habitação, proteção social, entre outras.
Crise econômica contribuiu para caos no ES
Lira enfatiza que o Estado do Espírito Santo sempre se destacou nos rankings de homicídios – o principal índice de medição da violência. Mas, em 2003, a situação teve uma guinada na gestão e no planejamento da administração pública, que resultou na reestruturação do setor da segurança pública no Estado.
A partir de 2009, os índices de homicídio tiveram quedas significativas no ES, mostrando que as políticas adotadas tiveram efeitos importantes. No entanto, Lira ressalta que desde 2012, o Brasil passa por uma importante crise econômica - o que gerou dificuldades para os governadores e os municípios manterem suas finanças públicas equilibradas.
A crise foi, segundo o especialista, implacável com o setor da segurança e penalizou as polícias. A PM do Espírito Santo, por exemplo, não teve suas remunerações corrigidas desde 2014. O governo estadual alega que não tem margem para poder fornecer qualquer reajuste para os servidores públicos.
De acordo com Lira, a única saída para esse impasse é o diálogo. “É preciso que os representantes deste movimento e do governo busquem um denominador comum que possa melhorar essa situação.” Para o professor, a crise vivida no Espírito Santo serve de exemplo para que outros Estados tenham consciência da importância da PM em todo o Brasil.
Outra questão, segundo Lira, é a necessidade de uma política de segurança pública nacional. Lira enfatiza que o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), lançado durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, deixou de funcionar durante a gestão de Dilma Rousseff. “Desde então vivemos um vazio nesta área”, salienta.
O especialista alerta que a decisão de convocar as tropas das Forças Armadas para patrulhar as ruas do Espírito Santo, no início da semana, não resolve o problema. O efetivo foi reforçado com mais 550 soldados nesta quinta-feira (9). “O exército não está preparado para lidar com esses distúrbios urbanos. Temos visto militares circulando com armamentos de guerra pelas ruas. Isso pode inspirar ainda mais insegurança na população”, conclui.

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