21 de dezembro, 2013 - 18:32 (Brasília) 20:32 GMT
Era para ter sido o primeiro topless em massa na praia de Ipanema, mas a convocação atraiu mais jornalistas e homens oportunistas do que mulheres.
Comentários desrespeitosos e de cunho machista não faltaram no primeiro "toplessaço" do Rio – organizado neste sábado para marcar o primeiro dia do verão e fazer campanha para que a prática deixe de ser crime e seja vista como natural.
Mas as reações na areia mostram que a realidade ainda está muito longe disso.
As primeiras mulheres que se arriscaram a tirar a parte de cima do biquíni foram rapidamente cercadas por dezenas de fotógrafos e cinegrafistas, muitos gritando para que olhassem em sua direção para fazer a foto.
Muitos homens reunidos no local perguntavam "cadê as oito mil?", em alusão às mulheres que haviam confirmado presença no Facebook.
Outros se dirigiam às mulheres vestidas dizendo: "tira! É pra tirar!". Um vendedor de chá mate no local gritava que aquele era "o mate do peitinho gelado".
O assédio fez com que muitas mulheres desistissem de participar. A estudante Julia Anquier, de 20 anos, diz que não se sentiu confortável para fazer topless.
"Estou chocada, muito decepcionada. É um estupro da mídia e dos homens que estão aqui. É muito baixo nível."
Uma de suas amigas chegou a receber uma "cantada" de um Guarda Municipal quando estava chegando à praia. Ao perguntar onde estava o evento, foi olhada de cima abaixo e ouviu: "você vai ficar linda, hein?".
O evento estava previsto para começar às 10h, na altura da Rua Joana Angélica, em Ipanema. O calçadão logo ficou tomado por jornalistas e por homens sentados para assistir.
Ao ver a plateia que as esperava, algumas mulheres foram embora sem sequer por os pés na areia.
Sucesso às avessas
A atriz Ana Rios, de 23 anos, que organizou o evento com amigas, diz que o resultado foi bem diferente do que se pretendia. Mas não deixou de considerá-lo um sucesso, já que o objetivo maior era causar reflexão.
"Acho que todo esse circo só reforça a importância do evento e de fazer com que todas essas pessoas falem sobre o assunto", afirmou.
Segundo ela, a repercussão do "toplessaço" tem a ver justamente com a espetacularização do corpo que se pretende criticar:
"As pessoas estão aqui para ver peitos. 'Peitos' de forma separada, sem considerar que é parte de um corpo, de uma pessoa. Os homens ainda vendo a mulher como um objeto a ser consumido."
O topless é considerado atentado ao pudor pelo Código Penal brasileiro, que data de 1940. Segundo Ana, neste ano houve oito casos de mulheres reprimidas por policiais por exibirem os seios.
"Isso ser crime é um absurdo. É uma prática tão simples que não pode ser crime."
Sutiã masculino
Nem todos os homens estavam no evento como plateia. A dupla de estudantes Rennan Carmo e Vitor Ferreira foram manifestar seu apoio. Ambos estavam sem camisa, vestindo um sutiã de biquíni.
"Peguei da minha mãe", explicou Rennan. "A gente veio mostrar que o direito é o mesmo. Se homem pode mostrar o peito, a mulher também pode."
"Mas parece que a sociedade ainda não está pronta para o topless", disse Vitor. "Talvez esse tipo de ação ajude a alavancar o debate."
O evento teve grande repercussão desde que foi criado no Facebook e noticiado em reportagens.
Segundo Ana, a página do "toplessaço" virou alvo de assédio por parte de grupos machistas ou religiosos. Muitos homens, em perfis falsos, começaram a dizer que iriam ao evento para ver "peitinhos" e se masturbar.
O temor de que participantes pudessem ser assediadas ou abordadas por policiais mudou a proposta inicial, que era de promover uma ação dispersa pela praia.
As organizadoras resolveram determinar um local para a concentração e buscaram apoio da Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB-RJ) e da ONG Anistia Internacional.
A pensionista Olga Solon, de 73 anos, não se deixou inibir pelo público todo e deu um mergulho com os seios à mostra. Ela mora em Portugal. Nas praias europeias, a prática do topless é comum.
"Topless é muito natural", afirmou, dizendo ter esperança de que a ideia avance no Brasil. "Só acho que as minhas filhas (de 51 e 53 anos) não vão gostar muito da ideia. São muito conservadoras."
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