Escassez enfrentada pelo setor pesqueiro eleva em 25% o valor dos pescados
16/04/2014 09:01 - Mariama Correia e Raquel Freitas, da Folha de Pernambuco
O peixe da Semana Santa enfrenta uma verdadeira via crúcis para chegar à mesa do consumidor. De um lado, os pescadores sofrem com a falta de incentivo e com a escassez dos frutos do mar provocado pelo desequilíbrio ecológico. Do outro, empresários enfrentam os altos custos da produção e o esvaziamento da mão de obra. Este conjunto de adversidades leva à importação - prática onerosa para o empresariado - e culmina no reajuste dos preços para o consumidor. Em alguns casos, a elevação pode chegar a 25%.
Em Olinda, a dona da Peixaria Holanda, Ingrid Holanda, explicou que a falta do pescado deve-se à baixa produção no litoral pernambucano, que anda encarecendo o produto principalmente nesta época do ano, quando ele assume o papel de protagonismo no mercado. Com intuito de driblar a pouca oferta e o aumento da demanda, a empresária, que está no ramo há 30 anos, disse recorrer à produção de outros Estados, como Rio Grande do Norte, Alagoas e Pará, para atender a clientela. “Cerca de 60% do estoque é de fora. Por isso, o nosso custo com o frete, com a câmera fria e com os motoristas aumenta em40%”, contabiliza.
A logística para dispor destes produtos é tanta que o reajuste passará a ser um peso a mais no bolso do consumidor. Se um cliente adquirisse o alimento com a pesca artesanal, o quilo de um tradicional peixe, a Cioba, por exemplo, custaria R$ 20. Demandado de outras regiões, este valor é reajustado em R$ 5. Mesmo com a morosidade da produção, a dona da peixaria diz estar otimista para o período da Páscoa. “Esperamos faturar 50% a mais que o ano passado”, ressalta. Este mês, o estabelecimento deve superar em 70% o faturamento de fevereiro, considerado pelo setor como um dos mais tímidos.
Além dos fatores ambientais, o desaparecimento da mão de obra é outro entrave para a diminuição da oferta de peixe. No ramo da pesca desde os 12 anos, o dono de duas unidades da TI Pesca, ambas em Olinda, Romilson de Holanda, lembrou que quando abriu a primeira loja, dez anos atrás, contava com três barcos e 12 pescadores. Agora, faltando poucos dias para a Semana Santa, o único barco e os cinco pescadores que restaram estão parados. “Pescamos apenas 300 quilos, que não pagam nem os custos com a embarcação”, conta. Os 30% de incremento prospectados nas vendas serão um alívio para Romilson Holanda, mas não chegarão a cobrir os gastos.
Para conseguir um bom resultado na época, o pescador Edilson Santana, de Brasília Teimosa, precisaria pescar pelo menos 80 quilos. “Devo conseguir 50 e lucrar R$ 200, pouco para me sustentar.” O presidente da Associação dos Pescadores do Estado de Pernambuco, José Carlos Cruz, conta que há tempos a pescaria não é a mesma. “Na década de 80, conseguíamos 700 quilos com apenas um barco em uma viagem com três dias de duração. Hoje, com 15 embarcações no mar, a quantidade da carga não chega a 1,5 mil quilos”, lamenta.
Governo - A Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária de Pernambuco informou que investe na pesca artesanal com programas como o Chapéu de Palha da Pesca Artesanal, que oferece capacitações e remuneração aos pescadores.
Crise também chega ao mercado
Tradicional ponto de venda de pescados, o Mercado de São José, no Centro do Recife, também sente os impactos da crise na pesca. Como a comercialização não está satisfatória, o comerciante Divaldo Gomes espera vender apenas 10% a mais que os demais meses do ano. “No ano passado, o faturamento da Páscoa chegou a R$ 18 mil. Este ano deve ficar em R$ 10 mil”, calcula. Entre os peixes mais procurados estão a cioba, o dourado e a cavala, que saem, em média, por R$ 30 o quilo. O preço do salmão, outro preferido das receitas, subiu cerca de 20% em relação a março. Para economizar, o consumidor pode escolher opções mais baratas, como a corvina, cujo quilo custa cerca de R$ 12.
O peixeiro José Neto espera vender 400 quilos durante a quaresma. Atualmente ele tem um estoque de 200 quilos e precisou investir R$ 2 mil na empreitada. Com a pouca oferta junto aos fornecedores, a estimativa de lucro no período é de apenas R$ 1,5 mil. Sobre a preparação do estoque, Neto revelou não armazenar os itens a longo prazo por conservar os produtos apenas no gelo. “O custo de manter uma máquina de refrigeração é maior que o nosso faturamento.”
Do outro lado, os consumidores não economizam com as compras da Páscoa. A aposentada Maria José de Andrade prevê uma ceia mais cara este ano.”Minha ideia era gastar R$ 60 para comprar quatro quilos de peixe, mas, acho que vou gastar mais que o planejado”, conta.
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