16 de maio de 2017 - 18h20
Para o economista Guilherme Mello, o presidente Michel Temer não entregou o que prometeu para a economia brasileira – a aposta nas reformas e na mudança do papel do Estado não deu resultados, e o país continua em recessão. Segundo ele, o aumento da atividade econômica, celebrado pelo ministro da Fazenda Henrique Meirelles, é fruto de uma “fraude estatística”, uma vez que o IBGE mudou sua metodologia. Na sua opinião, a gestão é “um fracasso para trabalhadores, pobres e classe média”.
Marcos Oliveira/Agência Senado
“Para quem é um sucesso o governo Temer? Para os bancos, que estão lucrando muito, e para os investidores financeiros de maneira geral. Quando você vê nos jornais a avaliação de que o Brasil está melhorando, é muito baseada na opinião dessas pessoas. Para elas, está de fato melhorando. Mas, para quem precisa de trabalho, de renda e crédito, o Brasil piorou”, disse Mello, em entrevista ao Vermelho.No último dia 12 de maio, Michel Temer completou um ano na Presidência. De abril de 2016 até março de 2017, o número de desempregados saiu de 11,4 milhões (11,2%) para 14,2 milhões (13,7%). E, embora o governo divulgue que a economia voltou a crescer, de fevereiro a março deste ano o setor de serviços teve redução de 2,3%, o maior recuo da série, iniciada em 2012. No mesmo período, a produção industrial caiu 1,8% e as vendas do comércio varejista 1,9%, no pior resultado em 14 anos.
“No geral, o governo não conseguiu entregar o que prometeu”, avaliou Guilherme Mello. Ele destacou que, quando Temer assumiu, já estava em curso um processo recessivo no país, que vinha desde 2015. Naquele momento, o próprio ministro da Fazenda de Dilma Rousseff, Joaquim Levy, já havia tratado de colocar em prática um pedaço da “estratégia liberal”, que incluiu corte de gastos, ampliação de juros e liberação dos preços administrados. O resultado do ajuste foi o aprofundamento da recessão.
“Então, o que Temer fez? Ele entrou prometendo retomar o crescimento por meio de reformas de longo prazo – terceirização, reforma trabalhista, da Previdência, PEC do teto de gastos. É como se ele falasse: ‘Levy fez o ajuste no curto prazo, mas não deu certo, não promoveu o crescimento, porque precisava fazer reformas de longo prazo. Precisa ser crível, confiável esse ajuste’”, diz Mello, sobre o discurso da gestão do PMDB.
De acordo com ele, essas reformas, contudo, alteram completamente a Constituição brasileira e o próprio paradigma do que é o Estado no Brasil. E, além de tudo, não têm servido para retomar a atividade econômica. “A aposta deles é assim: se a gente tirar o Estado brasileiro, o crescimento vai vir porque a confiança vai voltar. Então eles estão tirando completamente, sem colocar nada no lugar, mas o crescimento não vem, a confiança não volta e o desemprego não para de crescer”, criticou o economista.
Ilusão estatística
O governo tem anunciado que o país “entrou nos trilhos” e a retomada do crescimento "já começou". Segundo o professor da Unicamp, o discurso oficial não se sustenta, “é mera ilusão metodológica”. Isso por que, explicou, o otimismo da gestão é muito baseado em alguns indicadores de confiança – “mas confiança não é crescimento, porque eu posso estar confiante e não investir” – e em índices divulgados pelo IBGE em abril, que revisavam os indicadores relativos ao desempenho do comércio e dos serviços em janeiro.
A princípio, o órgão havia anunciado que, no primeiro mês do ano, as vendas do comércio caíram 0,7% em relação a dezembro, e os serviços recuaram 2,2%. Com a revisão, houve uma mudança brusca nos resultados. O comércio teria crescido 5,5% e o setor de serviços, 0,2%. A explicação para alteração tão intensa é uma mudança metodológica.
Para Guilherme Mello, a revisão é problemática, uma vez que não é possível comparar dados do ano passado – que utilizavam uma metodologia antiga, diferente – com as informações deste ano, coletadas a partir da nova metodologia. Na sua avaliação, do ponto de vista técnico, estatístico, a comparação é equivocada.
“É comparar laranja com banana. Com a mudança na metodologia, eles poderiam ter continuado a série antiga por mais um ano, para a gente perceber qual é a tendência, ou poderiam aplicar a metodologia nova para os dados antigos, para que a gente veja o que aconteceu no último ano. Mas eles se recusaram”, condenou.
Segundo o economista, o resultado revisado, portanto, não é confiável. “Fizeram essa comparação e aí aparece lá na estatística que tem crescimento. (…) Mas isso daí é uma fraude estatística. Não digo que a nova metologia seja uma fraude, pode ser muito bem feita, mas a comparação é que é equivocada. E eles se baseiam nessa comparação para defender que o crescimento voltou. Mas, se pegar a trajetória, mês passado, por exemplo, continua lá: consumo caindo, serviços caindo, comércio, indústria ruins”, ressaltou.
Na avaliação do professor, o máximo que o cenário permite avaliar é que há uma desaceleração do ritmo de queda da atividade econômica, o que, para ele, é natural em uma economia que está há dois anos em recessão. “Não tem muito mais para onde cair”, disse.
Austericídio
Em discurso para marcar um ano de governo, Temer ressaltou a ação de sua equipe no sentido de equilibrar as contas públicas. Citou como exemplo a regra que limita o crescimento dos gastos públicos.
Guilherme Mello lembrou que a gestão sempre partiu da ideia de que, cortando gastos e investimento público, seria possível resolver o problema fiscal. “Então fecha hospital, fecha faculdade, para de investir, não constrói rodovia, não constrói ferrovia, não faz nada. Só que, ao cortar gastos – especialmente em investimentos, que foram os que caíram muito –, o governo reforçou a recessão. Caiu a receita. Eles nunca iam conseguir entregar o que prometeram, que era melhorar as contas públicas, com esta estratégia.”
De acordo com ele, para resolver o problema fiscal, é preciso que o país volte a crescer. “O problema é que apostaram em estratégia de retomada do crescimento que fracassou. É a mesma estratégia do Levy, só que o Levy começou com o ajuste de curto prazo; Temer inverteu – ‘primeiro aprovo as reformas, depois vou fazendo os ajustes’, que é a ideia da PEC do teto”, afirmou.
Catástrofe para trabalhadores
O economista analisou que ambos os ministros fracassaram, porque partiram de um ponto de vista de como funciona a economia que é “equivocado”. “Eles acham que o problema é o custo do trabalho, que está muito caro e, portanto, tem que ser reduzido. E só assim o empresário iria lá e investiria. E como reduzir o custo do trabalho? Reduzindo direito trabalhista e salário. Como se reduz salário? Promovendo desemprego e recessão. Então eles fazem uma reforma trabalhista, que tira direitos, e promovem desemprego e recessão. E acham que assim o Brasil vai voltar a crescer. É óbvio que não funcionou.”
Temer e Meirelles têm celebrado a queda da inflação como uma conquista da gestão. O professor da Unicamp, contudo, destacou que o recuo já estava previsto e vem desde o governo Dilma, como consequência da própria recessão. “A queda da inflação é a consequência positiva de um fenômeno extremamente perverso, que é a recessão”, indicou.
Ele projetou que “é muito provável” que este ano o país tenha um crescimento muito próximo de zero, mas não descartou que haja um resultado negativo. “E é zero em cima de um PIB que já caiu mais de 7% (somando-se 2015 e 2016). Então a gente estagnou na série D. E, se tiver algum crescimento positivo, vai ser muito pequeno e puxado principalmente pela agropecuária, que é uma coisa que está muito fora do controle do governo”, opinou. Na sua análise, o bom desempenho da agropecuária tem pouco a ver com medidas de governo e deve-se, principalmente, a fatores como o clima e o mercado internacional.
“Então o balanço deste um ano de governo depende do lado que você está. Se você é um banqueiro ou investidor financeiro, talvez o governo não tenha sido tão ruim. Mas, se você é um trabalhador ou pobre, aí é uma catástrofe”, disparou.
Alternativas
Questionado a respeito das alternativas às medidas econômicas de Temer, Mello citou a necessidade de se realizar, sim, reformas, mas no sentido oposto às propostas pela atual gestão. “As reformas deveriam privilegiar a distribuição de renda. Ou seja, cortar privilégios dos que têm mais e garantir e aumentar investimentos e direitos para os que têm menos”, disse. Para ele, seria importante realizar uma reforma tributária que desonerasse a produção e o trabalhador e onerasse o estoque de riqueza dos mais ricos.
Além disso, ele defendeu que o governo deveria buscar formas de financiar o aumento do investimento em infraestrutura, que gera emprego e demanda; ampliar o crédito utilizando bancos públicos; e manter o câmbio um pouco mais desvalorizado.
“Acho que o Brasil está na contramão do desenvolvimento. Investe em uma estratégia que não só não promove desenvolvimento, como vai inviabilizar o desenvolvimento para o futuro”, lamentou.
Por Joana Rozowykwiat, do Portal Vermelho
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