Seis anos após ser aprovado, o Plano Diretor do Recife perde efetividade por falta de regulamentação de seus
instrumentos urbanísticos
Publicado em 15/11/2014, às 17h00
A sensação é de tempo perdido. Seis anos praticamente desperdiçados pela incapacidade do poder público de fazer valer um conjunto de leis que tinham como missão maior ditar o desenvolvimento da cidade. Aprovado em 2008, o Plano Diretor do Recife virou uma peça de ficção. Com validade de dez anos, corre o risco de caducar sem nunca ter sido efetivamente implantado. Em todos esses anos, o principal documento de ordenamento urbano da capital ficou à espera de leis complementares que nunca foram regulamentadas. Na prática, perdeu a sua eficácia. O hiato deixado pela inutilidade da legislação só fez o desafio aumentar. Regiões como o Pina, na Zona Sul, e Santo Amaro, no Centro (para citar dois alvos recentes do interesse imobiliário), repetem uma lógica de expansão saturada. E o recifense segue vendo, diariamente, a cidade crescer à revelia, sem planejamento e condenada a reproduzir os erros de sempre.
Na época em que o Plano Diretor foi aprovado, a promessa da gestão municipal era a de que a regulamentação aconteceria num prazo máximo de dois anos. O tempo passou e quase nada foi feito. O custo da inércia é alto. O Recife é uma das capitais do Nordeste com um dos maiores déficits habitacionais, amargando uma carência de quase 63 mil moradias. Instrumentos como o IPTU progressivo, o parcelamento e a desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública, todos previstos na legislação, ajudariam a atacar diretamente o problema. Se estivessem em vigor, as medidas penalizariam os proprietários que mantêm imóveis abandonados, combatendo a especulação imobiliária. A própria prefeitura havia estipulado, no momento da aprovação do plano, um prazo também de dois anos para identificar os imóveis fechados no Recife, mas até hoje esse levantamento nunca foi apresentado.
Sabendo quais são e onde estão as edificações ociosas, o poder público pode determinar quantas, em áreas bem localizadas, apresentam vocação para Imóvel Especial de Interesse Social, conforme está previsto no Plano Diretor. “Esses instrumentos são fundamentais para garantir o cumprimento da função social da propriedade. Mas tudo ficou condicionado a uma regulamentação posterior. Como ela não ocorreu, a cidade continuou entregue nas mãos do mercado”, critica Socorro Leite, diretora da ONG Habitat para Humanidade, entidade que participou ativamente do processo de discussão para elaboração do Plano Diretor. Socorro resume em uma palavra o sentimento que impera tantos anos depois: “frustração”. “É difícil apontar as melhorias trazidas pela lei. Infelizmente, apesar de todo esforço coletivo, não houve resultados práticos positivos para a cidade”, lamenta.
Pelo contrário. A gestão municipal perdeu uma excelente oportunidade de induzir o crescimento sustentável, por exemplo, no bairro do Pina, área que, nos últimos anos, vem passando por fortes transformações urbanas, com a chegada de investimentos comerciais e imobiliários. A explosão de prédios e a mudança acelerada da paisagem, no entanto, não vieram acompanhadas de um planejamento para construir uma melhor relação dos espaços públicos e privados.
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